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sábado, 19 de janeiro de 2013

Santa Cruz de la Sierra, 18 de janeiro de 2013.

Atravessando a pinguela...
         Dia morno hoje, sem passeios místicos e com um trabalho que poderia ter sido feito na minha casa, já que foi todo em meu computador. Até pensei em adiantar meu retorno, mas as companhias hoje colocam tantos empecilhos para trocas de passagens que fiquei só na vontade. Mas tudo bem, dias mornos também teu seu charme.
Não tendo compromisso pela manhã, não coloquei o relógio pra despertar. Acordei às seis e quinze... Os mais jovens não se assustem, velho dorme pouco. Trabalhei no computador até uma hora razoável para meu desayuno. Café da manhã de hotel, estilo buffet, com tempo, é uma maravilha né? Fiquei comendo por mais de uma hora, acompanhado do meu computador, entre notícias da politica local, do Botafogo e respostas a emails.
Com tempo livre, me dei ao luxo de caminhar uns 15 min, de mão dada com o sol, até a praça, atrás de um expresso. Ainda que a Bolívia produza bom café, aqui não se tem muito o hábito de prepará-lo bem. E, como no Brasil, o mercado interno não fica com a melhor parte. Mas na Cafeteria 24, em uma das esquinas opostas à Praça 24 de Setembro, tomei um bom expresso curto.
Sopa tapada e mocochinchi
Depois de um pit stop no hotel fomos almoçar de novo no el aljibe, já eleito o meu preferido daqui. Comemos um pastel de gallina. É um prato de forno, com um recheio a base de galinha caipira desfiada, batata e banana em pedaços, ovo cozido, uvas passa, cebola, temperos e algo de açúcar, que lhe aguça o doce já presente pela banana e pela passa. Este é o recheio de uma fina massa de trigo, tudo levado ao forno em um recipiente adequado. No visual quase parece uma lasanha. Como é bem molhado, acompanha bem com arroz. Muito gostoso, diferente, bem crioullo. Ou bem camba, na linguagem local. Comemos também a sopa tapada, prato parecido, mas com charque no lugar da galinha, menos doce, mais seco e envolto em massa de arroz e não de trigo. Gostoso, mas o pastel de galinha ganhou. E tomamos o que se tornou minha bebida da semana, o Mocochinchi.
Pastel de gallina
Saímos do almoço, tomamos um café e fomos direto a um supermercado comprar o pêssego seco que é a base deste refresco. Vou prepará-lo em casa. Nem sempre funciona isto, de se em ligar com uma comida local e tentar reproduzi-la em casa. Comida também tem contexto, entorno. Mas vou tentar, às vezes funciona. Daniel, meu filho de nove anos, agora virou um viciado em guacamole, um prato típico mexicano. Vamos ver o que meu povo acha do Mocochinchi. Comprei quinoa também, já que estou na Bolívia.
Como o sol seguiu de mão comigo, cheguei ao hotel, trabalhei um pouco no relatório da semana e fui para a piscina, tomar um banho, ler e relaxar, depois uma sauna para terminar a semana estafante. Estafante? É, acho que sim.
De noite fomos jantar em um restaurante Peruano, na Av. Monseñor Rivero, um boulevard com vários cafés e restaurantes, bem perto do hotel. E para nossa surpresa tinha carnaval! Blocos, jovens e crianças com suas fantasias e coreografias, as calçadas cheias de familiares assistindo. Um som animado, com uma forte influência da musica andina. Para quem nunca passou carnaval em outro país, é bom saber que ele não é vinculado necessariamente ao samba. É uma festa popular, meio pagã, meio cristã, o adeus à carne, visando a quaresma, e tem diferentes matizes nos diversos países. Não sei até que horas rolou a festa, porque minha carruagem está com defeito e deu para virar abóbora às dez da noite, achei melhor vir para o quarto.
Agora arrumar a mala e amanhã cedo pegar o rumo de volta. Valeu a semana, com mais reflexões que trabalho. Ganhei bastante, espero ter deixado algo também. Início de fevereiro tem Costa Rica, tudo dando certo, conto algo de lá.
Esta árvore, no Forte de Samaipata, me lembrou Saramago:
a solidão não é uma arvore no meio da planície 

onde só ela esteja, é a distância entre a 
seiva profunda e a casca,
entre a folha e a raiz..

                                                                                                                       

sexta-feira, 18 de janeiro de 2013

Santa Cruz de la Sierra, 17 de Janeiro de 2013.


Almoço no campo
Encontrei uma cidade para escrever meu livro. Samaipata. E um lugar para fazer minha viagem do autodescobrimento. O Forte de Samaipata.
Para uma descoberta tão importante, até que não viajei muito. Foram 130 km, para oeste de Santa Cruz. Em direção aos Andes, mas sem chegar nele. Subimos mais de 1000 metros, chegando a 2000msnm, em uma bela paisagem subtropical, com uma densa vegetação quase sobre pedra, indicando como a região é chuvosa. Durante parte da viagem costeamos um Parque Nacional bastante comentando por aqui, o Amboró.
Estrada de Santa Cruz à Samaipata
No meio da subida às vezes deparávamos com vales e cadeias de montanhas que se perdiam na distância. E é nesta paisagem, em uma das montanhas mais altas, que está o Forte Samaipata. Forte é como eles chamam este sítio arqueológico, patrimônio cultural da humanidade. Situado a uns dois mil metros de altura, o visual é lindo e o parque muito bem cuidado. O mais impressionante é uma pedra talhada, de uns 220 x 60m. Deixa eu tentar me explicar. São ruínas de uma cidade anterior aos espanhóis, provavelmente Inca, ou conquistada pelos Incas em algum momento. No meio desta cidade esta pedra enorme, uma espécie de centro cerimonial, onde eles foram desenhando seus símbolos, altares, lugares de rituais. Sempre talhando a pedra, e não construindo, trazendo pedras ou outros materiais, colocando coisa sobre coisa, como normalmente se fazia e ainda se faz. Diferente, tipo mais harmônico com o existente.
Local de cerimonia do Forte, esta é uma pedra monolítica, toda talhada
A mesma pedra, com estas espécies de altares. Talhados.
Hoje cedo recebi a notícia do falecimento de um amigo, e aproveitei o lugar para fazer minhas orações a ele. Difícil encontrar sítio mais adequado. Normalmente estes lugares tem uma energia boa, e este não é diferente, muito pelo contrário. Agradável, peaceful. Não é por nada que Samaipata significa “descanso nas alturas”. Lugar propício para descansar a alma, uma boa pedida para o momento. Meu e da humanidade. 
      Nesta mesma região estão os últimos lugares onde Che Guevara passou, tendo sido assassinado na quebrada del Churo. Existem passeios que refazem seus últimos momentos. E não muito longe tem umas Missões Jesuíticas, dizem que bastante conservadas. Mas não visitei nem um nem outro, vai ficar para a próxima.
A cidade é o que a Hebe chamaria de gracinha. Como almoçamos na casa de uma agricultora que visitamos no caminho, aproveitamos para tomar um café e comer uma sobremesa em um restaurante em frente à praça da cidade. Às duas da tarde o silencio era notável. Deu vontade de ficar uns dias por ali, usando o tempo entre passeios pela região e leituras na praça.
Vou dormir, amanhã é meu último dia nestas paragens. Quanto ao livro e ao autodescobrimento, fica para outra hora. Falta sabedoria para um e coragem para o outro.
Visual do Forte de Samaipata
Ruazinhas de Samaipata
Cozinha em uma casa de agricultores da região

quinta-feira, 17 de janeiro de 2013

Santa Cruz de la Sierra, 16 de janeiro de 2013.

Seminário sobre SPGs, Santa Cruz de la Sierra, Bolívia

Passei todo o dia hoje no seminário que organizamos aqui, nas instalações de uma ONG chamada CEPAC (Centro de Promoción de Agropecuária Campesina). Correu tudo bem e foi uma boa chance para me atualizar sobre o desenvolvimento da Agricultura Orgânica por esta parte do continente. Estiverem presentes mais de 40 pessoas, uma boa parte dela agricultores da região, algumas ONGs e associações.
Em países tão indígenas/campesinos como Bolívia, este esquema de agricultura orgânica, exageradamente normatizado, regulado e certificado não é muito sedutor. Mas por outro lado as condições socioculturais, quero dizer pobreza econômica e riqueza cultural, estimula a busca da agricultura orgânica em seu sentido mais genuíno e menos formal. E assim ela vai achando seu espaço e crescendo a seu modo.
Calçada simpática do centro da cidade
de Santa Cruz de la Sierra
Passado meu longo e pouco cansativo trabalho, arrumei tempo no fim do dia para dar uma volta pelo centro da cidade, ainda bastante quente. Só andei pelas ruas movimentadas, vi um comércio vigoroso, fazendo jus à maior cidade e maior PIB do país. E o povo comprando. Produtos, bens, coisas para todo lado! Novidades, vocês sabem, já não se acha mais, quase tudo made in China!
Com um dia com mais trabalho do que passeio, resolvi ir jantar em um restaurante típico, estilo turístico, mas cheio de gente local.  Como que para colorir o meu dia, já que o trabalho foi agradável, mas em preto e branco. Se chama La Casa del Camba  e é uma boa opção para sacar a gastronomia cruzeña. Cardápio variado, espaçoso, cheio. Comemos um menu local, no estilo vários pratos em pequenas quantidades. Estava bom, e de novo pedi Mocochinchi, o tal refresco típico daqui. Tinha musica ao vivo, tipo boleros e canções românticas brasileiras. Fiquei com pena dos cantores, parece que estavam meio deprimidos. Fui embora antes que tivesse que presenciar uma cena mais forte, tipo alguém cortando o pulso Ou que eu resolvesse cortar os meus... 
La Casa del Camba
Enfim, um dia sem grandes emoções. Mas quem precisa delas todos os dias? Às vezes é bom assim, mais tranquilito, né? 
O bom é que amanhã vamos ao campo, conhecer experiências de café, apicultura, controle biológico e ainda, de passagem, conhecer a cidade de Samaipata, que fica a 120 km de Santa Cruz e seu famoso forte, que consiste na maior pedra talhada do mundo, declarada pela UNESCO patrimônio cultural da humanidade. Depois de quase três dias de hotel, reuniões e seminários nada como um dia de visitas, pegar uma estrada, de leve, conhecer experiências locais e fazer um pouco de turismo. Boa combinação, amanhã conto como foi.

quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Santa Cruz de la Sierra, 15 de janeiro de 2013

Restaurante el aljibe, Santa Cruz de la Sierra

         Hoje o trabalho foi leve, uma reunião pela manhã e outra pela tarde, preparando o seminário sobre sistemas participativos de garantia que realizaremos amanhã, por sinal a principal atividade desta semana.
Com um pouco de tempo, resolvi aproveitar a hora do almoço, e demos nosso único passeio do dia. E aproveitamos para almoçar em um mui simpático restaurante, chamado el aljibe. Assim mesmo, com letra minúscula. Creio que para manter o ar de simplicidade quase sofisticada que tem o restaurante. Comida típica, local, muito bem preparada. A casa tem 130 anos, mantém seu ar rupestre e uma decoração a caráter, lembrando bem uma casa de pueblo. Mas, como deve ser um restaurante, ainda que um ambiente agradável componha bem o cenário, o mais importante é a qualidade da comida. E gostei muito do que comemos.
Keperi al horno
Eu pedi um Keperí al horno, pedaço de leitão assado, acompanhado de arroz com queijo e um pouco de mandioca. Janneth, uma amiga Peruana que me contratou para esta consultoria aqui, pediu Majado de charque. Arroz com charque, ovo e banana frita. Ótimo os dois. Mas o leitão estava sensacional, à moda antiga, gostinho de casa da vovó. Quem quiser dar uma olhada no site do restaurante, é o http://www.elaljibecomidatipica.com. E o que tomei, para acompanhar? Vinho? Cerveja? Coca-cola? Nada disto, tomei Mocochinchi um refresco feito à base de pêssego seco, com canela, cravo da índia e açúcar, típico do ocidente boliviano. Delicioso, super-refrescante.
Restaurante el aljibe, Santa Cruz de la Sierra, vista interna
E ainda passamos pelo Museu de Arte Sacra, que fica dentro da Catedral. Não gosto muito de arte sacra, que considero carregada e normalmente triste. Mas gostei de conhecer o Barroco mestiço, uma escola de arte que vi neste museu, expressada na forma de pinturas e peças em madeira ou prata trabalhadas com uma mescla do barroco trazido pelos Jesuítas e apreendido pelos nativos, que deram o seu toque. Bonito. Algumas peças em prata simplesmente impressionantes.
Acho que na verdade, todo nosso continente é meio assim, né? Mesclado, misturado, cruzado, amalgamado, fundido, mestiçado. Que bom, gosto muito disto. Se não fosse assim, um refresco a base de pêssego, cravo da índia, canela e açúcar não seria típico da Bolívia, né? Sim, acho que este refresco é um tipo de barroco mestiço também.
E no fim de tarde, aproveitando calor sem tréguas, ainda pude curtir a piscina do meu hotel caribenho encrustado no cerrado boliviano. Piscina, sauna seca e a vapor, sorvetinho para repor as energias. Como dá trabalho isto da agricultura orgânica. Por falar em trabalho, hora de dormir, amanhã tenho que moderar o seminário e justificar meus honorários!
Piscina do hotel Cortez, Santa Cruz de la Sierra

terça-feira, 15 de janeiro de 2013

Santa Cruz de la Sierra, 14 de janeiro de 2013

Catedral de Santa Cruz de la Sierra
Aqui estou na minha primeira viagem de 2013, em Santa Cruz de la Sierra, Bolívia. A minha geração ouviu muito, lá pelos anos 70, Diana Pequeno decantar esta cidade: "Enquanto este velho trem, atravessa o pantanal, rumo à Santa Cruz de la Sierra...". Na real é a quarta vez que venho por aqui, mas sempre me sinto enganado. Não sei se por esta música, ou por estar na Bolívia, ou talvez pelo nome, "de la Sierra", mas sei que ela engana. Não se trata de uma simpática e charmosa cidadezinha dos Andes Bolivianos, mas sim de uma cidade grande, a maior do país com seus quase dois milhões de habitantes e economia vigorosa, baseada principalmente no gás natural, madeira e pecuária. E nem é tão serra assim, esta a apenas 400 msnm.
Cheguei hoje de tarde e vim aqui para fazer um trabalho parecido com o que fiz em Honduras, na minha última viagem. Identificar o potencial e as estratégias para desenvolver um mercado local de produtos orgânicos. Passo esta semana entre seminários, entrevistas, visitas de campo. Sempre relacionado com a Agricultura Orgânica, ou seja, estou em casa. Este não chega nem a ser meu tema favorito, é na real o meu único tema. Ao menos em termos profissionais. 
Ao redor da praça, suas calçadas em arco
Como disse, não é a primeira vez que venho a Santa Cruz, mas mesmo assim fui dar uma caminhada pelo centro da cidade, ver sua Plaza de Armas e sua Catedral. Acompanhado do Sol, ao meu lado todo o tempo. Santa Cruz é muito quente. Hoje chegou a 36°. Acho que por isto que eu pingava de suor e sentia saudades do meu quarto de hotel e seus 18°. Mas valeu, ao menos vi a praça, o que sempre gosto. É que chego nestas praças e absolutamente não sei onde estou, por tantas e tantas outras a que este desenho de lugar me transporta. A praça arborizada, seus caminhos diagonais unindo suas esquinas, a estátua de um conquistador no centro, do outro lado calçadas quase sempre protegidas do sol com suas coberturas em arcos. Em frente à Igreja vendedoras de velas, na praça vendedores de comidinhas e fotógrafos, lambe-lambes modernos, com câmara digital e impressora, mas com o mesmo modus operandi e senso estético. Tudo isto envolvido pela presença do comércio, da Igreja e prédios do Estado. E de gente. Bastante gente.
Jantei no próprio hotel, o Cortez, nada especial, mas um lugar agradável, já que o hotel tem uma piscina, cercada de vegetação e mesas, um agradável calor pela noite, dando a ele um visual e um ar tropical, quase caribenho! Acho melhor dormir, porque parece que já comecei a delirar, estou em Santa Cruz de la Sierra, não em Santo Domingos ou Aruba.