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quarta-feira, 16 de novembro de 2016

Lima, 15 de novembro de 2016

Filho do Sr. Gilberto. Que mirada...
Passei o dia cantarolando Milton Nascimento. Com a roupa encharcada e a alma repleta de chão, todo artista tem de ir aonde o povo está. Se foi assim, assim será...
Uma das hortas que visitamos.
Hoje fomos ao campo, não em uma boleia de caminhão, mas em uma pequena van, com amortecedores vencidos, banco sem molas e entrada permitida ao calor e ao pó. Com oito lugares, em alguns momentos éramos 13. Foi interessante. E divertido. Nem só de VIP lounges ou Uber Black vive o homem.
A primeira visita foi em Carapongo, cerca de uma hora e meia de Lima. Visitamos algumas das oito famílias da "Associação de Bioprodutores de Carapongo La Esperanza". Esta associação faz parte da APARL - Associação de Produtores Agroecológicos da Região de Lima.  Por sua vez a APARL integra a ANPE - Associação Nacional de Produtores Ecológicos do Peru.
O grupo La Esperanza e nós, os "estrangeiros".
O primeiro produtor que visitamos foi o Sr. Gilberto. Desde 2008 sua produção é orgânica e ele já foi certificado pelo método que se conhece como auditoria ou terceira parte. Agora integra o SPG liderado pela ANPE. SPG - Sistema Participativo de Garantia, é um método que permite que os próprios produtores, de forma organizada, atestem a qualidade da sua produção. O SPG, além de ser mais barato, propicia uma troca de olhares e experiências que significa um valor agregado em relação ao sistema de certificação por terceira parte.
Na visita nos explicaram como funcionam. Vou tentar contar em breves palavras. Para começar, aquele que deseja ser certificado deve integrar um grupo de no mínimo seis famílias. Este grupo elege um deles como avaliador interno. Todos devem velar pela qualidade ecológica da produção. 
"milho de polenta"
Este avaliador interno participa de algumas etapas de capacitação para apurar mais seus conhecimentos sobre a produção ecológica e sua percepção sobre a confiabilidade do trabalho desenvolvido por cada família e para preencher os inevitáveis papéis exigidos no mundo da certificação. Fazem dois tipos de visita. Uma anunciada e outra de surpresa. Esperanza, uma simpática produtora, é a avaliadora local. A avaliação feita por esta avaliadora irá ser analisada pelos grupos e eventuais problemas serão resolvidos neste âmbito. Esta avaliação, após discutida em grupo, irá para uma instância que se chama Conselho Regional do SPG, que irá definir se o produtor está ou não apto a ser considerado orgânico. Esta decisão o Conselho Regional, integrado por lideranças de produtores e consumidores, além de outros setores, como ONGs e Universidades, irá tomar a partir dos documentos recebidos e uma visita por amostragem em cerca de 20% dos produtores. Quando passa por todas estas etapas, a família recebe um atestado de produtor ecológico. Atestado e não certificado, pelo fato do SPG não estar reconhecido pela legislação peruana que trata da regulação e controle da produção ecológica. Esquema interessante – tem mais elementos, mas tentei ser breve na descrição. A outra possibilidade é contratar uma empresa de certificação. Paga, preenche uma série de formulários exigidos, é avaliado e se tudo está ok recebe seu certificado. 
Visual no campo, em Santa Eulália.
O grupo La Esperanza era certificado por uma empresa, e cada família pagava de mil a dois mil dólares por ano. Com o SPG não pagam nada, apenas precisam participar, ou seja, usar parte de seu tempo. Mal comparando, é como cortar grama do meu quintal, posso fazer ou posso pagar alguém para fazer para mim. 
Uma última coisa sobre isto: Com a perda de mercado por parte das empresas certificadoras, não é de se estranhar que elas fazem um constante trabalho de lobby junto ao governo nacional para manter os SPGs fora do marco legal. No Brasil se passou o mesmo, e, finalmente se conseguiu a incorporação dos SPGs na legislação que trata do tema. Com isto, as empresas perderam mercado e se viram compelidas a baixar seus preços.
Bom, este longo parágrafo acabou virando aulinha sobre certificação – vou deixar assim, já acho que muitos dos apreciadores dos produtos orgânicos não sabem o que está entre eles e aquele “selo” que os identifica nas prateleiras.
Cuy. Nosso almoço de hoje. 
Mas teve mais. A segunda parte da visita foi em Santa Eulália, um pouco mais longe, a um grupo de mulheres que produzem hortaliças e preás. Sim, preás, aqui chamados de cuys e muito comuns na alimentação na zona do altiplano. Hoje comemos cuy no almoço. Prefiro chamar cuy do que preá, me sinto menos ogro.
Fim do dia, cansados, foi tempo de comer outra vez no corretíssimo Punto Azul e vir para o hotel assistir ao Brasil ganhar do Peru pelas eliminatórias. O tema ontem e hoje aqui foi este jogo, e naturalmente todos queriam puxar este assunto comigo. Minha resposta é que eu havia pedido aos meus amigos da seleção para ganhar só de 1 x 0.  Errei, mas 2 x 0 não chega a ser agressivo, acho que sobrevivo. Deu por hoje, amanhã vamos ao campo outra vez.

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