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sábado, 19 de maio de 2018

Lisboa, 17 e 18 de maio de 2018

O Tejo visto do Cais do Sodré
Cheguei ontem a Lisboa, amanhã cedo saio rumo a São Tomé e Príncipe. Está parada aqui foi apenas para respirar um pouco, passear, comer bacalhau e ter uma pequena reunião que ocorreu hoje pela tarde, com o representante da FAO em Portugal e sua assistente, para conversar sobre um possível apoio para o desenvolvimento dos SPGs, Sistemas Participativos de Garantia, nos países lusófonos. Veremos. Junto comigo estava a Flavia, uma amiga que trabalha na IFOAM - Federação Internacional dos Movimenta de Agricultura Orgânica. IFOAM é quem está me convidando para ir a São Tomé e Príncipe. De resto foi passear e comer. Bolinho de bacalhau, bacalhau ao forno, bacalhau ao Brás! E vários pastéis de nata, um dos doces mais famosos da rica culinária portuguesa. Dureza...
Visual do Museu Fundação
Calouste Gulbenkian
Por uma feliz coincidência, hoje foi o dia do Museu em Lisboa, o que significa que todos estavam de portas abertas, for free. Eu, que adoro museu e não resisto a um 0800, juntei um e outro e aproveitei para visitar alguns. Às dez da manhã já estava na porta do mais bem avaliado de Lisboa, a Fundação Calouste Gulbenkian. Uma impressionante coleção particular, com obras as mais variadas, não apenas pictóricas. Interessante pensar no indivíduo que passa a vida inteira colecionando obras de arte. Como seria o olhar dele sobre o mundo, que mirada estética ele colocava sobre o que via, como identificava o que lhe interessava e quais fatores incidiam na tomada de decisão de uma compra. Posso imaginar que algumas delas caríssimas. Peças de diversas culturas, tapetes orientais enormes de 3, 4, 5 séculos de existência, vasos chineses também antiquíssimos, quadros de Degas, Millet, Tuner, Monet. Esculturas de Rodin
Willian Tuner, no Calouste Gulbenkian
Enfim, um Museu lindíssimo. É uma viagem pensar que todas as obras eram de um só colecionador. Completa o cenário uma bela cafeteria, lounge para apresentações, um parque muito bem cuidado, exposições temporárias convidadas. De fato um lugar para passar horas. Mas eu não tinha tantas horas, e antes do meio dia já estava indo para minha parada obrigatória em Lisboa, a casa de Fernando Pessoa.
Casa de Fernando Pessoa
Além de ser meu poeta preferido, sempre que leio algo dele, ou sobre ele, descubro uma novidade. Hoje, por exemplo, soube que seu famoso baú ainda guarda cerca de três mil documentos a serem decifrados. Este baú foi encontrado na sua casa, quando da sua morte, repleto de papéis. Os escritos vem se tornando públicos pouco a pouco ao longo de décadas. Ele escreveu freneticamente durante sua vida. No seu quarto, nesta casa que visitei, está, além da sua cama, a escrivaninha famosa onde surgiu o seu heterônimo mais importante: Alberto Caeiro. Vou reproduzir aqui o que ele escreveu a um amigo, Adolfo Monteiro, em 13 de Janeiro de 1935, numa carta bastante conhecida entre admiradores e estudiosos de sua obra:
A cômoda do nascimento de Alberto Caeiro
... Ano e meio, ou dois anos depois, lembrei-me um dia de fazer uma partida ao Sá-Carneiro — de inventar um poeta bucólico, de espécie complicada, e apresentar-lho, já me não lembro como, em qualquer espécie de realidade. Levei uns dias a elaborar o poeta mas nada consegui. Num dia em que finalmente desistira — foi em 8 de Março de 1914 — acerquei-me de uma cómoda alta, e, tomando um papel, comecei a escrever, de pé, como escrevo sempre que posso. E escrevi trinta e tantos poemas a fio, numa espécie de êxtase cuja natureza não conseguirei definir. Foi o dia triunfal da minha vida, e nunca poderei ter outro assim. Abri com um título, O Guardador de Rebanhos. E o que se seguiu foi o aparecimento de alguém em mim, a quem dei desde logo o nome de Alberto Caeiro. Desculpe-me o absurdo da frase: aparecera em mim o meu mestre...
Réplica do baú de Pessoa.
O original está com um privado
Entender Pessoa não é fácil. Eu desisti há muito tempo. Só leio e aproveito as sensações que advém da leitura.
Para completar meu passeio por museus fui à casa de Amália Rodrigues, a fadista portuguesa que levou o nome do seu país ao mundo. Não acho que no Brasil tenhamos uma ou um artista que significa para o país o que Amália significa para Portugal.
Sua casa é linda, na maior parte mantida tal e qual era quando ela vivia ali e percorrer seus cômodos é conhecer mais de sua vida e caminhar sobre lembranças. Minha mãe gostava muito de Amália, assim como toda uma geração de brasileiros que a viu gravar e se apresentar em nosso país por décadas, dos anos 1940 até os anos 1970. 
Lisboa visto desde a Alfama!
E entre tudo isto ainda pude caminhar muito. Ontem, quinta-feira, ao entardecer, pelo Rossio, passando pelo Arco da Augusta, Tejo a partir do Terreiro do Paço e caminhando pela sua margem até o Cais do Sodré. Fui também ao Chiado, parando no café A Brasileira para ler um pouco no mesmo local que Fernando Pessoa frequentava.
Hoje caminhei pela linda e nostálgica Alfama. Aliás, terminei o dia neste bairro, comendo bacalhau e ouvindo Fado em um pequeno restaurante, em uma construção de mais de 400 anos. Segundo o Pedro, dono desta casa de Fado que fui, o Fado nasceu nas caravelas, na época das grandes navegações, quando, ao escurecer, para espantar o medo da noite e o temor do desconhecido, os marinheiros começavam a declamar os versos de Camões, o universal poeta de língua portuguesa. 
Arco da Augusta
Da declamação saudosa à música, da música ao Fado, que, portanto, é filho da saudade. Pedro, fã de Camões, tem também sua verve de poeta e a poesia navega fácil entre suas palavras... ele ainda completa: era o Fado, saudade musicada, que trazia os marinheiros de volta...
Adoro o lirismo poético da alma lusitana.
Valeu minha parada em Lisboa. Amanhã viajo para São Tomé e Príncipe. Conto de lá!




Pedro e seu restaurante A Viela do Fado

Rua Augusta, coração de Lisboa

Achei esta rua... Minha Santa de devoção...

Chiado

Monet

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